Há 97 anos, em 1915, Albert Einstein apresentou sua Teoria
Geral da Relatividade à academia Prussiana de Ciências em Berlim, publicando no
ano seguinte uma tese com conteúdo mais detalhado de seu pensamento, trazendo
para os diversos campos do conhecimento humano a ideia radical de que não há
pontos referenciais absolutos no universo e, consequentemente, não há verdades
absolutas. Tudo depende de como e quando o observador está experimentando o
evento.
Anos mais tarde, Ilya Prigogine, químico russo radicado na
Bélgica, ganha o Prêmio Nobel de Química por seu rico trabalho no campo da
termodinâmica, especialmente no que ficou conhecido como sistemas instáveis ou
de não equilíbrio.
Tópicos como a irreversibilidade dos eventos e a
predominância de sistemas instáveis no universo são centrais nas teorias de
Prigogine, quem, segundo Attico Chassot – autor do importante livro Alfabetização Científica, ajudou a
ciência moderna repensar sua
postura dogmática e neutra, tendo de passar a funcionar, efetivamente, como um instrumento para contribuir para a
existência de uma sociedade mais justa.
Em seu
discurso de agradecimento ao Nobel, Prigogine afirma que uma ciência para o
benefício da humanidade só será possível se estiver intimamente ligada à cultura como um todo e ao presente,
imperando ampliar a distribuição de informações científicas ao público geral,
formá-lo para degusta-la, além de um mergulhar mais profundamente e, por vezes de
maneira mais contextual, nos problemas de nosso tempo.
Tanto Einstein
quanto Prigogine se ocuparam em compreender o universo de formas menos
retilíneas, interessados potencialmente nas transformações que ocorrem “em
vários sentidos e tempos”, às quais, por dificuldade de extrapolar o
convencional, terminamos por não alcançar ou as dispensamos após leitura pouco
cuidadosa e, frequentemente, descomprometida com os efeitos que determinados processos
podem acarretar em nossas vidas.
Lamentavelmente,
o Brasil ainda não goza de uma estrutura educacional e científica que dê conta
de aproximar, da realidade majoritária dos brasileiros, estudos e conceitos
potencialmente mobilizadores e carregados de significações importantes às
mudanças pretendidas e empresadas em solo nacional, seja pelo Governo, seja por
corporações multinacionais, tais como irreversibilidade,
princípio da incerteza, teoria dos jogos e mesmo a tão famosa Teoria da
Relatividade.
Continuamos
como os homens primitivos, agrupados diante de um monolito negro, representante
do desconhecido, assustador e retransmissor da energia perpétua de nossas
experiências passadas e futuras, como no magnífico filme 2001: uma odisseia no
espaço de Stanley Kubrick.
Mas que
tem isso de importante no cenário paraense?
Penso que
o momento não pode ser mais propício para se trazer questões complicadas e
instigar a sociedade estadual a comparecer questionando alguns baluartes do
ainda pouco elucidativo – e talvez conveniente! – discurso científico de nossas
instituições de ensino e pesquisa e de importantes intelectuais de toda região
Amazônica. Temas como aquecimento global, sustentabilidade, assoreamento de
rios e ainda, desertificação da Amazônia não podem mais ser tratados como
segredos institucionais ou conhecimento pessoal.
Sobre
isso, em 2009, quando laureado com o título de Doutor Honoris Causa pela UERJ, o renomado geógrafo Aziz Ab’saber, teceu
severas críticas ao governo brasileiro e às instituições de ensino que, por
omissão ou insuficiência, ajudam a perpetuar “absurdos” como o termo Desertificação
da Amazônia e a tratar a sustentabilidade como uma palavra de significados
infinitos, diminuindo o empenho em ampliar a compreensão científica de tópicos
e categorias científicas que fundamentalmente definem o termo e dão
consistência à sua utilização universal, mas nem sempre devida.
Junto
disso, questões políticas e sociais frementes na região e no estado, tais como
a falta de uma pauta política governamental que respeite de maneira inequívoca,
os anseios sociais e cubra, pelo menos em termos de propostas, as reais
necessidades da população parecem ter encontrado fôlego para a mobilização
social. Basta ver os últimos acontecimentos populares em Belém e pelo Brasil.
Certamente,
a questão central, não se resume aos R$ 0,20 de reajuste da tarifa de ônibus em
São Paulo, ou mesmo aos bilhões gastos na infraestrutura da copa do mundo,
evento que, a meu ver, respeitando sua importância sociológica ao Brasil, não
se trata e jamais se tratará de pauta política ou de necessidade de repaginação
estrutural do país. Precisamos de hospitais, de médicos, formados aqui e não
importados como quer a presidenta.
Ao mesmo
tempo, as reações populares tratam justamente de tudo isso, ainda que
desorganizado, não muito claro ou não escrito em um papel timbrado e endereçado
calmamente aos governantes. O timbre de população brasileira já deveria bastar.
Mas há que barulhar para que a correspondência seja entregue. Mas fica a pergunta:
quem coordenará o pós-manifestação? Que grupos estarão dispostos a manter uma
agenda permanente de diálogo com o governo?
Isso é
coisa de partido político, dizem alguns. Outros arriscam que já fizemos nossa
parte: abrimos os olhos do governo, não
vamos permitir mais vilipêndios e falsidades contra o povo. Certo! Mas desde
Einstein os resultados são “multi-produzidos”, por assim dizer. Se assim o é,
também temos nossa polpuda contribuição na atribuição dos comandos da nação.
Como povo e como indivíduos. Como produtos e produtores de nossa história,
posto que também, fizemos escolhas e nem sempre estas estiveram apontadas para
o coletivo e para o resguardo da cidadania. Penso que na refrega dos combates
recentes, não haverá o movimento sucessivo e necessário de novas organizações
para o debate e o fazer – ou refazer? – político, assim como não surgirão novas
institucionalidades que deem conta daquilo que se pretende transformar.
Mais uma
vez, seremos banhados pela incerteza. Localmente, estas questões e mais as
peripécias dos países ditos aliados, acumulam-se sobre a pauta ainda não bem
estabelecida de proteção do patrimônio ambiental da Amazônia, da proteção dos
reservatórios naturais de águas que temos – últimos do mundo – além de não dar
conta, sequer de novas formulações a respeito do estado de respostas locais
potentes o suficiente para se colocar na infantaria do bem, para o
enfrentamento dos graves problemas pelos quais a Amazônia e o Pará ainda
passam.
Nesses
territórios a preocupação com estudos científicos que contribuam para
compreender a dinâmica social, econômica, ambiental, enfim, de todos os matizes
da vida humana na região, deveria ser central, especialmente depois de
cientistas como Einstein e Prigogine. Os grandes temas da Amazônia e do Pará,
como aqueles citados mais acima, não podem mais ser abordados através da
convencional liturgia científica praticada de maneira extensiva na região, a qual
antes de esclarecer, parece estar diluindo, quando não impedindo, a compreensão
da sociedade acerca de seus problemas e, consequentemente, diminuindo o
potencial de geração de respostas conjuntas às demandas vindouras.
Tal como
aconteceu no passado, é tempo de convocar a curiosidade e o trabalho árduo, de
vencer os clubistas que encastelam os ativos científicos locais, em todas as
disciplinas e em todas as esferas de ação, mas, principalmente é preciso
recorrer à responsabilidade cidadã, a fim de sejam ORGANIZADAS novas formas de
apresentação, cobrança e acompanhamento das demandas sociais, sob a pena de que
as novas mobilizações passem a ser tratadas como atraso ao calendário de um
evento esportivo e as incertezas, nossas mais assíduas cobradoras,
multipliquem-se e se tornem incontornáveis.
J.Mattos